Apressada


Ana Helena Reis

Seis horas da tarde, o casamento ia começar em instantes. Atrasada como sempre, Milena deu o último retoque na maquiagem, olhou no espelho para ver se nada estava fora do lugar e pegou as chaves do carro. Já ia chamando o elevador quando se lembrou que estava sem bolsa. Correu para pegar aquela pequenininha, que era mais adequada ao evento, e lá enfiou rapidamente o que pinçou da bolsa do dia a dia, sem nem olhar.

Quando entrou no carro, percebeu que o marcador de combustível estava na reserva mas, olhado no relógio, constatou que não dava tempo de parar em um posto de combustível — afinal, ela era madrinha e todos já estavam em posição no altar. Rapidamente calculou o trajeto e viu que era tão pertinho que não teria problema se abastecesse na saída da igreja.

Lá se foi, confiante, e até estranhou que ninguém estava ligando para saber o porquê do atraso – isso significava que estavam todos tranquilos. Ao olhar para o lado, porém, percebeu que havia esquecido o celular. “Droga! Mas também tudo bem, não posso usar durante a cerimônia, mesmo...”
Igreja lotada, ela entrou pela lateral e se colocou em posição. Tudo resolvido.

Ao término da cerimônia, a procura de um posto de abastecimento antes de se dirigir para a festa. A opção mais próxima se situava em uma avenida de grande movimento, e lá foi ela. O que não esperava – uma ladeira a enfrentar. Foi a conta para que a reserva do tanque ficasse abaixo do nível; o carro tossiu, tossiu e morreu.

Mulher decidida e independente, Milena colocou o pisca alerta e lá se foi, a pé, buscar gasolina no posto. que ficava a duzentos metros. Foi atendida por um gentil frentista que, olhando os trajes da garota, preparou uma garrafa Pet de 2l com tampa para colocar o combustível e comentou:
— Assim não tem perigo de sujar o vestido, dona. Quando conseguir dar a partida a gente completa o tanque e você me paga, falou?

Exultante com sua proatividade e se sentindo muito autossuficiente, pois até o momento não havia recorrido a ninguém, ela agora só precisava descobrir como abrir a portinha do combustível, coisa que jamais tinha pensado em fazer. Tentou, tentou e nada. Foi para o meio fio e começou a fazer sinal para as motos que passavam, até que um rapaz parou:
— Moça, é super simples, veja aqui essa trave. Deixe que coloco pra você.
Maravilha! Resolvida essa parte, agora era só o carro pegar. Tentando manter a calma pensou: “Está tudo dando certo, logo mais consigo abastecer e nem vou precisar comentar com ninguém que, pela décima vez, fiquei sem gasolina na rua”.

Deu a partida. Nada. Mais uma vez, nada. Na terceira, a bateria arreou. Tentou não perder o bom humor, pensar em uma solução honrosa. “Sim! É só chamar o guincho do seguro, por que não havia pensado nisso?”

Deu uma sapateada de ódio ao se lembrar que tinha esquecido o celular em casa. Tentou então se acalmar e pensar em uma solução – não havia outra, a não ser entrar em algum estabelecimento e pedir para usar o telefone do local.

Enquanto se preparava para sua aventura pela avenida, foi surpreendida por uma pessoa batendo furiosamente no vidro do passageiro – era um grandalhão, ordenando que entregasse tudo o que tinha e ficasse quieta.

Apavorada, entregou sua bolsinha de festa e ele, satisfeito, sumiu rapidamente pela ruela ao lado. Ela ficou ali, paralisada no banco por alguns segundos até criar coragem para tomar alguma atitude. Lembrou que estava sem celular, e agora também sem a bolsa e com ela a carteira. Já que não tinha outra escolha, correu até a loja mais próxima. As pessoas a acolheram imediatamente, trouxeram um copo d’água e chamaram um táxi para levá-la em casa. Sim, porque não poderia ir direto para a festa sem antes tomar as providências necessárias.

No caminho, começou a se preparar psicologicamente para a maratona: primeiro, pedir o guincho, depois, avisar o banco, cancelar o cartão de crédito, marcar um horário para refazer os documentos, enfim, uma longa lista de aborrecimentos.

Ao entrar em casa, logo na mesinha ao lado da porta estava a bolsa do dia a dia e, lá dentro, o celular, a carteira, os documentos! Não pode deixar de soltar uma gargalhada. O ladrão havia levado somente alguns cosméticos e um lencinho.

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