O caminho de volta


Cris Netto

Tenho lido muito sobre como levar uma vida com propósito, fazer o que se ama, chutar o balde e encontrar sentido naquilo que se faz. Parece que as pessoas que hoje estão com seus 30, 35 anos descobriram que a vida nas pequenas cidades, no litoral, na serra ou em outros países funciona em um ritmo não só diferente, mas principalmente, no ritmo certo.

Na época de nossos pais e antes ainda, dos nossos avós, a economia aquecia as grandes cidades e diminuía a qualidade de vida no campo. Se um agricultor quisesse que seu filho fosse alguma coisa na vida, deveria juntar todas suas economias e mandar o filho para a Capital. Só assim ele poderia estudar, cursar uma faculdade e se quisesse, depois de formado doutor, poderia voltar para sua cidade, desde que já tivesse sua pequena fortuna acumulada. Em alguns casos, a bolsa auxílio como estagiário na Capital era mais do que os pais ganhavam com um mês de produção de maçãs, por exemplo. No entanto, muitos dos filhos dessa geração, da época dos nossos pais, não voltaram ao campo. Firmaram-se nas cidades grandes e lá construíram suas famílias, encontraram bons empregos e criaram seus filhos. Mas não sem sentir saudade do cheiro de mato, dos raios de sol entrando pela janela, da lenha queimando no fogão, do som do leiteiro trazendo a bebida matinal nas garrafas de vidro verde. Eram dias sofridos, de trabalho árduo na lavoura, mas eram dias mais felizes.

E essa saudade não ficou só na lembrança, foi transmitida para os filhos, que agora estão construindo suas vidas em torno de bons empregos, carros do ano, telefones de última geração, Rivotril para dormir e despertador para acordar. A vida é mais fácil, mas também mais rápida. Tudo tem a urgência que no cenário anterior não se via. Eles, ou nós, vivemos com uma certa estabilidade, porque, resguardados casos extremos, não dependemos do clima para garantirmos o dinheiro do mês. Se chover um mês inteiro ficaremos molhados, entediados, no máximo deprimidos, mas dificilmente perderemos toda a produção de um ano inteiro de trabalho. Sob essas perspectivas, vivemos uma vida melhor.

Será? Temos menos trabalho braçal, por assim dizer, porque os que vieram antes de nós construíram máquinas que podem trabalhar enquanto pensamos. Mas, somos realmente mais felizes? Se sim, por que há tantas pessoas estressadas, doentes, obesas, com diversos tipos de transtornos relacionados ao stress, à má alimentação, ao sedentarismo, enfim, ao recheio que vem junto com o bolo da revolução tecnológica?

O que tenho visto ultimamente é muito mais do que modismo. São jovens profissionais, no auge de suas capacidades produtivas, com uma grande bagagem de conhecimento teórico, embarcando em viagens não só geográficas, mas principalmente para dentro de si mesmos, em busca do que lhes falta, nesta sociedade que oferece quase tudo: vida, tempo, propósito, realização.

Mais do que a satisfação pessoal, a vida com propósito engloba o bem do outro. Fazer aquilo que você ama, ajudando o outro a também encontrar o seu caminho. Nessa linha, tem crescido o movimento de profissionais especializando-se e optando pela profissão de coaching, justamente porque há uma grande demanda de pessoas perdidas, insatisfeitas com a realidade e sem ideia de por onde começar a agir. O que conta não é o meio, mas sim, a decisão de abrir-se e aceitar o que você vai descobrir.

No momento em que eu planto a semente da dúvida em alguém, então já estou começando a agir sobre ela e ajudando-a a livrar-se de crenças sabotadoras que escondiam, dela mesma, todo o seu potencial. STalvez a escrita ainda não seja uma profissão, e sim um hobbie, mas com certeza ela já é o meio através do qual eu passo minha mensagem ao mundo.

Entre tantos conselhos, treinamentos, retiros, no fundo, no fundo, bem lá no fundinho, o que se quer é voltar no tempo e viver como nossos avós, seja no interior, no litoral, na serra ou na China. O que vale é ter a mesma liberdade que eles tinham, de escolher como levariam seus dias, sem a urgência descabida dos tempos modernos.

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Cris Netto

E-mail: cristiane.snetto@gmail.com

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