O tau da mula


Luiz Alexandre Kikuchi Negrão

Aqui na mureta branca de restaurante de Thera (Fira), Santorini, avisto todas brancas as casinhas e a Igreja de Santa Irene e de Oia, outra cidade, além dos navios de cruzeiro, um deles de onde vim, o horizonte, o vulcão Mikris Kamenis e o Mar Egeu. São quatrocentos metros abaixo e para subir do Donkey Terminal, ao lado do porto de Skala, dá trabalho. Literalmente com o tau (τ): os físicos explicam que trabalho, representado pelo tau, é a força vezes o trabalho. Aqui a pé são seiscentos e cinquenta e sete degraus de uma escadaria (cerca de 1,3 quilômetro) ou pegar o teleférico ou, ainda, de mula (atração local). Embora rápido no percurso, limpo, conservado e panorâmico, o teleférico custa muito euros, com longas filas, nele viajam várias pessoas juntas dentro da gôndola e perdem-se os detalhes. A pé é de graça e, por eu estar em forma de bola, fica mais fácil subir um pouco e descer rolando. A solução é a mula: embora o passeio custe poucos euros, posso descansar enquanto o quadrúpede sobe os degraus. Descubro rapidinho meu engano: a mula sobe um pouco e pára sob o sol forte para descansar, tomar água e aliviar seu intestino e a bexiga (ainda bem que o papel e o eletrônico não fedem), e lá vai quase uma hora e meia neste zigue-zague cheios de pedras até o topo em “Fira”. Sem este tempo gasto, é priorizar com reserva de duas horas antes da partida do cruzeiro para curtir as cidades no topo da montanha: explorar os locais e conversar com pessoas no inglês com sotaque grego e do resto do mundo e no grego de viagem (kalimera!, efharistós, e outras palavras úteis), comprar lembrancinhas (como a mula de pelúcia), entrar na igreja, além de tirar selfies e registrar imagens do casario branco com janelas, portas e telhados azuis (a maioria é assim, mas há várias coloridas) e do horizonte. O almoço é churrasco grego (gyros, com carne boa), pão sírio com molho de pepino, sal, alho, azeite de oliva e iogurte (tsatziki – uma delícia refrescante) e vinho branco. Para queimar as calorias, o negócio é revogar a lei do mínimo esforço e nada mais de mula. Assim como eu, elas também têm problemas na coluna e exaustão, além das feridas com a sela depois de milhares de passeios. O tau favorável se dá descendo a pé a escadaria até o porto e no navio a tempo, com o sol beijando o Egeu.

deixe um recado | voltar

Luiz Negrão

E-mail: luizalexandren@gmail.com

Pageviews desde agosto de 2020: 1758

Site desenvolvido pela Plataforma Online de Formação de Escritores