Dia Perfeito x Dia Perfeitamente Possível


Cris Netto

Existe um exercício de escrita que instiga o pretenso escritor a transpor para o papel o que seria um dia perfeito. Eu fiz esse exercício algumas vezes e, talvez não tenha tido sucesso, porque o único sentimento que ele me trouxe foi de frustração. O dia perfeito só amanhecia nas páginas do caderno. Pula para os dias de hoje, em um cenário pandêmico, e vamos reescrever um dia perfeitamente possível.
Eu acordaria cedo, antes do nascer do sol, colocaria café para passar, enquanto olharia as primeiras notícias do dia. Como não haveria mais interesse na pandemia, nem nenhuma catástrofe acontecendo, abriria o livro de cabeceira e leria algumas páginas para me inspirar. Nessas alturas, o café já está pronto e a casa começa a acordar. Capricho na mesa, corto as frutas, dobro os guardanapos como se estivesse em um hotel. Todos sentam à mesa, recapitulo a agenda do dia e cada um segue para seus afazeres. Caminhada, pracinha com o filho, atividades de casa "before school". Preparo o almoço e levo o filho na escola. Volto para casa ou fico em algum café com internet. Começo a escrever. Duas a quatro horas de escrita me garantem as crônicas semanais e as páginas do romance. Saída da escola, happy hour eventual com os amigos e retorno para casa.
Em casa, há uma divisão perfeita do trabalho. Pai providencia sozinho o banho do filho, sem me chamar nenhuma vez. Enquanto eu preparo a janta. Depois, tomo meu banho, cineminha em família e cama. Filho agarrado no pescoço, mãos do marido entrelaçadas por baixo dos travesseiros.
Sem Ferraris na garagem, empregadas para cada tarefa, nem cinco dígitos na conta bancária.
Apenas calma, parceria, realização, propósito e respeito. O mínimo valor possível. O essencial, a sobrevivência. De tão simples, chega a virar perfeição.


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Cris Netto

E-mail: cristiane.snetto@gmail.com

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