Show do Milhão


Ana helena Reis

O que você faria se tivesse ganho o prêmio máximo num desses concursos tipo Show do Milhão?

No filme Slumdog Millionaire (Quem Quer Ser Milionário), acompanhamos a trajetória de Jamal Malik Othman, um órfão de 18 anos dos bairros de lata de Bombaim e que está a uma pergunta de ganhar 20 milhões de rupias (cerca de 300 mil euros), feito que nenhum participante jamais conseguira até então.

Lançado em 2008, Quem Quer Ser Milionário é um filme britano-estadunidense ,uma adaptação livre do livro Q & A, do autor indiano e diplomata Vikas Swarup. Dirigido por Danny Boyle (autor de Trainspotting), e filmado na India, conta com muitos atores indianos como Freida Pinto (Latika), Irffan Khan e Anil Kapoor (Prem Kumar). Seu principal protagonista Dev Patel (Jamil), porém, é um ator britânico filho de pais indianos. O filme embolsou oito Oscars, como Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia e Melhor Canção Original, entre outros.

Amante do cinema, nos primeiros dias de exibição lá estava eu sentada, de olho na tela à espera da última questão que decidiria o prêmio; minha sensação, e creio que de grande parte da audiência, foi de estar frente à TV assistindo ao “Show do Milhão” e imaginando o que ganhar esse prêmio poderia significar na vida daquele candidato. O sonho do milhão, da fortuna que cai no colo de repente, exerce um fascínio sobre aqueles que não divisam outra oportunidade de enriquecer honestamente. E coloco aqui a ressalva – honestamente - porque as mega fortunas oriundas da corrupção política, por exemplo, também caem no colo e com um agravante: os afortunados quanto mais têm mais querem ter, não se contentam com o primeiro milhão que, normalmente, é a meta máxima da vida dos participantes desses Shows.

Tudo levava a crer que a trama do filme deslancharia a partir do momento em que Jamal ganhasse o prêmio máximo. Qual seria o impacto dessa fortuna na vida desse menino que, como muito outros que conhecemos na vida real, se tornam milionários da noite para o dia, haja visto alguns jogadores de futebol, cantores, Mcs e o recentes fenômenos midiáticos que são os Youtubers.

Nesse momento um interesse pelo filme até diminuiu, pensando se tratar de mais um desses filmes que conta a vida de sucesso ou fracasso do protagonista que enriquece subitamente.

Ledo engano. O filme, além de emocionante, é surpreendente! conta com um elemento fantástico que entra em cena na hora em que a polícia desconfia de que Jamal está fraudando o concurso e passa a interroga-lo, já que ninguém acreditava na possibilidade de um rapaz pobre e sem instrução levar o prêmio máximo. A partir daí a trama passa a ocorrer em dois tempos: o presente, que é o rapaz sendo inquirido pelos policiais sobre como conseguiu acertar cada questão, e o passado, quando então ele conta a linha de raciocínio que o levou a saber as respostas.

É dessa narrativa complexa e inusitada que entramos no mundo de Jamal e na história de sua infância; a cada questão, a chave da resposta traz à tona a miséria, o infinito poder de corrupção do dinheiro e, ao final, a surpreendente revelação do objetivo de Jamal em participar do concurso – não o prêmio em dinheiro, mas se fazer presente na televisão para que seu eterno amor, Latika, com quem viveu num orfanato e acabou perdendo de vista, o reconheça.

Essa reviravolta dá ao filme uma conotação poética, mas sugere também um outro olhar para o dinheiro, que é seu papel como meio e não como fim. Dinheiro pode ser o meio para se conquistar alguma coisa de valor pessoal muito maior, como foi o caso de Jamal. Mas como um fim em si mesmo é uma armadilha perigosa, pois aguça a ambição e com isso afrouxa os valores morais; para conseguir sempre mais e mais a lógica passa a ser “ o fim justifica os meios” e nesse jogo vale tudo, até vender a alma.

Nunca passei pela experiência de ganhar dinheiro em concursos ou sorteios, mas esse desfecho me fez refletir sobre o quanto, no decorrer da minha própria vida, o dinheiro foi um meio para as conquistas pessoais que almejei. Elas eram legítimas, mas até que ponto dependiam de ganhar dinheiro para conquista-las? e o quanto esse dinheiro, ganho com bastante esforço inclusive, passou a ocupar um espaço e definir outros rumos à minha vida?

Fazendo então um paralelo com a história do Jamal, fica uma pergunta no ar: qual seria o caminho desse menino, depois de ganhar 20 milhões de rupias e reencontrar sua amada?

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